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Marcos Hinke

Exercício n° 4: A empatia aplicada na escrita


Você provavelmente nunca foi um repórter freelancer alterando cenas de crime, mas como consegue se relacionar com Louis Bloom?

A empatia é a habilidade de se colocar no lugar do outro, a capacidade de entender e sentir o que outra pessoa está experienciando e ela é natural nos seres humanos (em alguns menos do que em outros). É muito fácil sentirmos empatia por aqueles que vivem situações parecidas com a nossa, que convivemos diariamente ou que concordam com nossa visão de mundo. Mas, e com alguém que não conhecemos? Ou alguém que vivencia situações que nem podemos imaginar? Se não conseguimos estabelecer (ou ao menos tentar) uma conexão com pessoas reais, como podemos esperar criar pessoas fictícias relacionáveis?

Para entender empatia.

Criar e desenvolver personagens empáticos, que sejam capazes de engajar e tocar o público é uma das tarefas mais árduas na construção de um roteiro. E criar traços de humanidade, que tornem personagens fictícios em seres relacionáveis, é uma tarefa dolorosamente complexa.

É comum, e até certo ponto saudável, escrevermos sobre o que conhecemos. Porém, algumas armadilhas mentais podem nos jogar em uma zona de conforto limitadora, levando-nos a escrever histórias teses, onde só queremos impor e comprovar nossa opinião sobre o mundo e os personagens são meros meios para um discurso. Nessa zona é muito fácil se criar personagens bondosos em um nível sobre-humano incapazes até de peidar para não destruir a camada de ozônio e vilões que soltam abundantes solilóquios sobre o quanto sentem prazer em propagar suas maldades. Para evitar essa zona maniqueísta é essencial fortalecer as habilidades de se colocar na pele e nos olhos dos outros.

Assim, propomos um simples exercício de empatia, não para o público, mas para roteiristas que buscam características que vão além da bondade e da vilania extrema para seus personagens.

1) Transforme alguém que você não gosta em um personagem empático

Nossa mente adora criar teorias que distorcem a realidade para se adequar a nossa visão de mundo, assim, acabamos reduzindo pessoas que de alguma forma nos incomodam, a características vazias e muitas vezes não realistas. Escreva uma cena envolvendo uma pessoa que você não gosta. Ela precisa ser a protagonista da cena, porém, tente ter algumas coisas em mente enquanto desenvolve a cena:

  • Quais são as motivações dele como personagem?

  • Traga características extremamente ternas e humanas envolvendo a pessoa;

  • O que o faz pensar e agir dessa maneira?

  • Quais são as suas vulnerabilidades?

  • Não minta para você mesmo. Se esforce para que o personagem da cena seja a mesma pessoa que você não gosta- os mesmos tiques, trejeitos e atitudes que te incomodam- mas que ele mesmo assim, tenha características humanas relacionáveis.

Escreva como se você fosse queimar as páginas quando terminar. A intenção não é criar um personagem para ser utilizado em alguma história, mas se esforçar para ver as pessoas por outras óticas, mesmo que isso signifique rever conceitos que você já acredita serem certos. Procure aquilo que te incomoda e ao invés de rechaçar, como instintivamente fazemos, exercite sua habilidade de compreender o outro, o que ele busca, o que ele teme, o que ele sente.

2) Escreva uma cena real de sua vida

Pense em algum momento marcante de sua vida, que tenha uma importância grande em seu desenvolvimento. Escreva a situação com se fosse uma cena.

Provavelmente, sua primeira opção será escrever a cena sob seu próprio ponto de vista. Escreva novamente, desta vez pelo ponto de vista de outra pessoa que também vivenciou ou simplesmente presenciou esse momento.

Busque expressar o que ela deve ter sentido e como ela se sentiu em relação a você. Reflita:

  • Como se desvencilhar do seu próprio ponto de vista dessa situação?

  • O que essa pessoa teria sentido?

  • Esse momento também foi marcante para essa pessoa?

  • Distancie-se. Analisando como um(a) roteirista, quem passou pelo maior impacto dramático na situação?

3) Estude seus filmes favoritos com anti-herói

Os protagonistas de cinema e de séries não precisam mais ser personagens moralmente irretocáveis - na verdade nunca precisaram ser. Mas como transformar uma personagem que você odiaria na vida real, em um personagem relacionável? O que levar para a tela que mostre que apesar de único, ele é tão humano e complexo como todos nós?

  • Como o personagem é apresentado?

  • Que cenas são utilizadas para despertar empatia do público?

  • O personagem se vê como uma pessoa "moralmente questionável"?

  • Se a história tivesse como protagonista um dos outros personagens apresentados, como nos relacionaríamos com nosso anti-herói? Ele seria o antagonista da história alheia?

Todo mundo é protagonista em sua própria história. Ser roteirista, entre outras coisas, é reconhecer o protagonismo do outro.

Vídeo do canal Lessons from the Screenplay falando sobre O Abutre e como a empatia foi utilizada em um anti-herói beirando a psicopatia. Ative as legendas em português.

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